5 de julho de 2012

Concurso III/2012: Crisálida (PG)

Título: Crisálida
Autor: Thife
Categoria: Concurso NFF III/2012, UA/RA; UA; Point of View (1st person - Liam Payne); Actor fic (One Direction)
Advertências: Nenhuma
Classificação: PG
Capítulos: 1 (one shot)
Completa: [X] Yes
Resumo: As coisas andavam estranhas na minha vida antes mesmo do unicórnio cor-de-rosa aparecer.

N/A: Essa fic é livremente inspirada no universo criado no RPG "Changeling: The Dreaming". Por favor, não confundam com a nova versão do jogo, "Changeling: The Lost". Elas não têm nada a ver uma com a outra quase
N/A²: Se você é fã de Supernatural, ignore tudo que você conhece da série sobre changelings. A definição aqui é bem diferente. Se você não conhece One Direction, tente ler esse texto como uma HO, ok?

N/A³: Ouça com os olhos, leia com os lábios e deguste com o ouvido.

"Às vezes eu sonho com um bosque. E com um córrego manso e calmo que cruza as árvores e alcança uma clareira. Há música no ar e eu posso senti-la vibrando em minha pele. Uma canção de heróis e grandes criaturas que o tempo apagou, uma melodia esquecida pelo tempo, jazendo no fundo da minha alma querendo ser entoada. No bosque há vida, há cores que nunca enxerguei. Há vozes que festejam e pés que celebram a primavera das eras. E os donos desses pés e dessas vozes sorriem como se nunca houvessem sido esquecidos, como se nunca houvessem sido exilados de seu mundo. Eles são cor, são brilho, são a fantasia dos sonhos infantis e dos desenhos pintados por mãos ingênuas que ainda se mantém ligadas a esse mundo antigo e fantástico. E essas criaturas de sonho celebram para se manterem vivas e lembradas. São sonhos da humanidade, esquecidos sob a poeira das eras. São as fadas dos contos antigos, os sátiros dos mitos ancestrais, a fé em tudo que é belo que a humanidade esqueceu. São o que eu sou."




As coisas andavam estranhas na minha vida antes mesmo do unicórnio cor-de-rosa aparecer.

Podem achar que eu sou louco, mas apenas falo a verdade. Acho que se eu tivesse ido a um psiquiatra eu teria sido taxado de insano ou algo do tipo. Mas eu não sou. Não sei bem quando começou, mas, desde que eu consigo me lembrar, eu não sou como as outras crianças. Era sempre como se eu me sentisse deslocado. Distante de mim mesmo. Eu sabia que não via as coisas como os outros. E sabia que via as coisas que ninguém mais via. Havia cor em tudo que eu olhava, mesmo no que não deveria ter cor. Eu via bolas de luz colorida flutuando pelas ruas à noite como estrelas particulares e poderia jurar que a minha professora da pré-escola tinha grandes e esplêndidas asas de borboleta.

Eu acreditei por mais tempo do que a maioria das crianças nos velhos contos de fadas, nos sonhos de Papai Noel e Coelhinho da Páscoa. Eu me fantasiei de super-herói por anos e sempre brinquei de faz de conta, sendo sempre um grande herói a empunhar uma espada feita de pedras da lua. Eu tinha uma necessidade inexplicável de acreditar em tudo que era imaginário e toda vez que alguém me dizia que algo não era verdade, que era apenas uma história, eu sentia uma parte de mim morrer. Deixar de acreditar doía. Por isso, eu nunca deixei de acreditar, ainda mais depois de ver um coelho acenar para mim no jardim e indicar onde ele havia escondido ovos brilhantes de chocolate doce como o elixir da vida.

Eu tive mais amigos imaginários do que poderia se esperar de uma criança normal. Mas, diferente das outras crianças, eu sempre soube que eles existiam porque eu queria que eles existissem. E apenas por isso, eu sempre soube que eles estavam ali e não estranhei quando meu pai encontrou sinais das pegadas do Tuggie, na neve do quintal depois de um Natal especialmente nevado. Ele, obviamente, disse que deveria ter sido algum roedor qualquer, mas eu sempre soube que ratos não deixavam pegadas de seis dedos que brilham como cristal sob a luz do sol.

Eu sempre fui o tipo de garoto que poderia ser encarado como infantil se as pessoas prestassem atenção em mim. Não que eu parecesse ser, pois eu passo a impressão de ser sério, centrado e tudo mais. Mas eu sempre guardei escondido sob a minha cama os livros de contos de quando eu era criança e há uma parede no meu quarto onde colei todos os desenhos de quando eu era mais novo. São desenhos infantis, rabiscos coloridos em uma folha de papel. Mas eu nunca deixei de ver beleza neles. Eles sempre significaram algo para mim, como se eu ainda os visse com meus olhos de menino. Eu os via como fantásticos dragões, valorosos guerreiros e terríveis lobos gigantes a se digladiarem em planícies de grama que brilhava como se feita de luar. Eles significavam alguma coisa em minha alma e eu os olhava sempre com aquele fascínio com que as crianças observam tudo. É uma curiosidade instintiva, um fascínio natural por tudo, algo que nunca me abandonou.

Meu nome, aliás, é Liam Payne. E todas essas coisas sobre mim que eu nunca entendi começaram a fazer sentido em um dia que pareceu começar como qualquer dia normal. Logo que acordei pude sentir o gosto frio do sereno matinal em minha boca e a expectativa de mais um dia sorrir para os meus olhos que se abriam lentamente. Sentia no ar o gosto de manteiga derretendo lentamente na torrada e aquilo me deixou mais disposto para levantar.

Eu havia acabado de sonhar. O mesmo sonho de sempre. Bosques, flores e criaturas dotadas de certa aura mística a cantar canções que eu conhecia. Aquele sonho vinha se tornando mais e mais recorrente e a cada vez que eu o sonhava, o sonho se parecia mais real e a realidade um reflexo mais distorcido deste sonho.

Saí da cama e encarei a mesma parede de desenhos que eu mencionei antes. Eu gosto de acordar e olhar para ela porque isso me dá mais ânimo para levantar e encarar as horas seguintes do dia. E, claro, encarar meu pai. Se você o conhecesse talvez entendesse meus problemas com ele. Ou talvez não. Ele é só um cara simples. Normal, eu diria. Ele tem um emprego em um escritório que não poderia ser definido por outra palavra que não chato. Mas ele não se incomoda com isso. Ele é completamente acomodado à situação. Ele nunca aspirou a nada mais na vida, para ser sincero. Ele nunca teve gosto pela aventura.

Ele sempre foi uma pessoa prática, de certo modo até metódica. O certo é o certo e só devemos nos ater àquilo que é realmente provável de acontecer. Há uma cartilha a se seguir para ser bem sucedido na vida. Escola, faculdade, emprego razoável, família, casa com garagem, longe do tráfego intenso do centro, e o carro do ano. Não há espaço para grandes sonhos na vida real. Não há lugar para desvios. Ficar correndo atrás de esperanças vãs é inútil. Ele fizera questão de deixar isso claro quando eu tinha nove anos e eu disse que queria ser cantor. Ele riu e falou que eu deveria para de sonhar, focar nos estudos e tentar me esforçar para conseguir um bom emprego e me dar por contente por isso. Mas eu sei que permaneceria descontente. Vazio de algo que eu não sabia dizer o que era, mas que faria falta.

Ele é o completo oposto da minha mãe ou da minha irmã e acho que isso explica muito o fato de eu sempre ter me apegado mais a elas. Minha mãe sempre tivera algum resquício daquela fagulha de esperança no olhar, que queimava intensamente como um sol quando ela ouvia minhas histórias ou via os desenhos que eu fazia. E Ruth ainda tinha toda aquela ingenuidade das crianças pequenas, que acreditam que qualquer explicação fabulosa sobre um fato é a verdade. Secretamente, eu acreditava nisso tanto quanto ela.

Tomar café com meu pai foi tão agradável como sempre. Ele, como de costume, não parecia se importar com o gosto delicioso da torrada que mastigava com desatenção enquanto lia a seção de economia do jornal matinal. Acho que ele nunca percebeu a diferença incrível entre o gosto da manteiga normal e dela derretida. Apenas mais uma das maravilhas da vida que ele não conhecia.

"Por que você está usando capa de chuva se não está chovendo?", ele se voltou para Ruth que comia seus ovos mexidos, brincando de fazer desenhos com as gemas.

"Não é uma capa de chuva, é um vestido de princesa!", ela respondeu, pondo-se de pé e dando um rodopio, no qual vi luzir um vestido, com a cor das pétalas das flores que inundavam nosso jardim, feito da mais delicada das sedas e ornado com imagens de pássaros que alçavam voo e cantavam melodias com sabor de pêssego. Eu não pude deixar de sorrir.

"Você sabe muito bem que isso...", ele começou

“Querido, pode me passar a seção de artes?”, minha mãe interveio antes que ele completasse a frase e eu e ela sorrimos cúmplices. O resto da refeição foi feito quase todo em silêncio enquanto eu me perguntava como minha mãe conseguia fazer ovos mexidos tão leves como o sabor das nuvens. Eu estava me levantando para sair quando Ruth me segurou pelo braço, retendo-me mais por seu olhar inocente e seu sorriso puro do que por seu gesto.

“É para você.”, ela me entregou um desenho de um animal que brilhava iluminado pelas cores do crepúsculo, uma imagem milhões de vezes mais linda do que aquilo que estava disposto no papel, mas que eu conseguia enxergar através da tentativa dela. Sorri fascinado com aquela imagem exuberante que ela compusera para mim em sua cabeça.

“Eu achava que isso não tinha essa cor...”, meu pai começou a falar, mas eu logo o interrompi.

“Obrigado, Ruth.”, falei, dando-lhe um beijo na testa e colocando o desenho que ela fizera na mochila enquanto saía pela porta da cozinha. Aquele pequeno gesto da minha irmã fez com que eu me sentisse bem – e leve – como eu não me sentia há algum tempo, como se algo se acendesse em meu coração e se espalhasse pelo meu corpo como uma onda.

O caminho para a escola foi o mesmo de sempre. Eu ia de bicicleta como em qualquer dia normal, mas naquela manhã o cinza do concreto parecia me esmagar com mais força e, como nos dias em que meu espírito aventureiro estava mais aflorado, eu saí da estrada e segui por uma das trilhas do bosque que margeava a estrada velha. Era diferente a sensação de ver o cheiro das flores do auge da primavera passando por mim e deixando em minha pele a cor de seus perfumes. Eu me sentia conectado com aquele ambiente livre do contato com o homem, de certo modo. Era como se cada galho de árvore fosse parte de mim e suas folhas meus dedos, roçando o azul do céu e sentindo o calor que uma cor tão fria poderia emanar. As árvores passavam por mim em grande velocidade conforme eu desbravava a mata, vendo apenas de relance algo que me lembrava grandes pilares de luz e vida que se espiralavam como colunas gregas, ligando a terra e o céu, como pontes a conectar dois mundos.

Eu sentia o vento cantar para a pele do meu rosto a sinfonia dos pássaros silvestres que se espalhavam entre os galhos das árvores. Fechava os olhos, sem medo. Meu corpo parecia conhecer toda a sensação indefinível de fazer parte daquilo. Quando eu fechava os olhos era como se eu pudesse realmente ver as coisas como elas eram, como se minha imaginação visse tudo com mais clareza que meus olhos. Via cada árvore transpirando vida, exalando o cheiro dos amores que foram jurados sob suas sombras e gravados em suas peles com palavras que na minha mente brilhavam como estrelas no céu noturno. Via os resquícios dos passos das crianças rescenderem no chão, sombras das aventuras que elas viveram, tementes das criaturas que sonhavam habitar aquele bosque.

E a minha frente eu o vi. As vestes ornadas de um grande senhor, com os detalhes mais ínfimos bordados em ouro puro. Cada centímetro de seu manto era coberto com a imagem de uma cena qualquer sobre um grande castelo de outrora, planando sobre as nuvens, onde festas regadas a néctar, ambrosia e as demais comidas e bebidas divinas eram organizadas, com torneios de cavaleiros onde minha alma se projetava, como se eu quisesse desesperadamente ser um dos guerreiros a empunhar uma espada e jurar lealdade a um escudo de algum nobre. Sua face era como o retrato da beleza, aquela que não se vê em nenhum rosto humano, o mesmo tipo de imagem que eu compunha em minha mente quando imaginava os elfos ao ler os livros de Tolkien, mas milhares de vezes mais bela e real. Ele estava parado a me olhar soberbo e soberano e, conforme me aproximava, eu sentia a tentação de abrir os olhos.

E a minha frente agora estava Zayn Malik, tão perto que se eu não tivesse freado a bicicleta teria me chocado contra ele. Havia surpresa no modo como eu o olhava, eu sabia. Talvez pelo choque de encontrar alguém da escola naquela parte do bosque. Ou porque minha mente cismasse em associar a imagem que eu imaginara de olhos fechados com o garoto que eu via diante de mim. Mesmo de olhos abertos, minha imaginação tentava se fazer prevalecer, a imagem do senhor nobre se sobrepondo à figura do garoto que me olhava com certo espanto.

Zayn era um garoto da escola onde eu estudava. Não exatamente qualquer garoto. Ele sempre fora o típico garoto popular por quem quase todas as garotas já tinham se apaixonado. Sério, centrado e indiscutivelmente belo. Um tanto distante, a maioria das pessoas concordaria, mas igualmente fascinante. Eu nunca trocara uma palavra sequer com ele. Pertencíamos a mundos distantes demais dentro daquela escola. O capitão do time de futebol e o presidente do clube de química não costumavam passar muito tempo juntos. Talvez por isso eu estranhasse aquela simpatia atípica e sensação de afinidade que eu via nos olhos dele.

"Plebeus não deveriam andar por aqui a essa hora", ele disse e eu sequer estranhei a forma como ele me chamou de plebeu. Apenas parecia o certo, quase tanto quanto a reverência simples que eu lhe fiz. Era quase como se houvesse algo magnético demais na presença dele para que eu resistisse. Eu precisava mostrar respeito a ele, assim como só poderia me erguer e seguir meu caminho com a bicicleta depois do gesto de dispensa que ele me dirigiu. E eu voltei a correr contra o vento, sentindo ao mesmo tempo uma sensação de confusão e completa compreensão sobre o que acabara de acontecer.

Cheguei à escola ainda aturdido pelo que havia ocorrido. As imagens sobrepostas de Zayn e do nobre de minha imaginação vinham à mente, fazendo com que eu me sentisse cada vez mais perdido. Ainda assim, como se meus sentidos estivessem ampliados enquanto eu devaneava, não pude deixar de perceber uma pequena confusão que se estabelecia em um ponto do pátio onde nenhum professor ou responsável da escola parecia estar. Aproximei-me o suficiente para ver Garrick, um imenso brutamontes metido a dono do pátio, ameaçando um garoto menor, que se encolhia contra a lixeira, como se diante de algum tipo de pesadelo.

Eu o reconheci no mesmo instante. Niall Horan era um estudante de intercâmbio que estava estudando na minha escola mal havia dois meses. Mesmo que não houvesse realmente grandes diferenças culturais entre Glasgow e a área do rio Piddle, ele sempre parecia deslocado naquele lugar. Era como se a ingenuidade que ele aparentava ter não se encaixasse com o clima asquerosamente frio e sem vida daquela escola. Sempre que eu o olhava sentia como se o compreendesse por se sentir tão estranho naquele lugar. Eu mesmo me sentia um estrangeiro ali. Em qualquer lugar.

Enquanto eu fitava a cena eu senti um ímpeto de interferir e aconteceu a mesma coisa que já acontecera milhares de vezes antes, mas à qual eu nunca me habituara. “Aja”, uma voz exigiu em minha cabeça, a mesma voz que me atormentava desde criança e me fizera pensar tantas vezes no quanto eu estava enlouquecendo. E a frequência com que eu vinha ouvindo aquela voz – que por vezes parecia mais a minha voz do que a minha própria – nos últimos dias fazia eu duvidar cada vez mais da minha sanidade. Mas ainda assim, eu a ouvi.

Invadi o círculo de pessoas que observavam a briga e me interpus entre Niall e Garrick, desafiando o agressor com um olhar tão certo e seguro que eu sabia que não seria meu normal. Mas parecia que todo o medo que eu pudesse ter de apanhar havia me abandonado enquanto eu observava a face dele, que a mim parecia feia como uma carranca, com aquela boca enorme cheia de dentes pontiagudos cobertos de sangue luminoso, como uma fera, um monstro saído dos pesadelos de uma criança. Sustentei ainda assim o olhar daquilo, que me lançou um sorriso desdenhoso e sarcástico enquanto se afastava, lançando-se uma frase de deboche.

“O honrado cavaleiro veio ao socorro do pequeno serviçal?”

A forma como ele enunciara “honrado cavaleiro” continuou a ressoar em minha cabeça por um momento, como se ele houvesse dito aquilo, naquele tom, de propósito. Virei-me, sacudindo a cabeça para esquecer Garrick, e estendi o braço para que Niall se levantasse. Demorei a perceber que eu estufara o peito e ostentava uma postura assoberbada, que logo tratei de desfazer.

“Por que ele estava te importunando?”, levei a mão à nuca enquanto, preocupado com o garoto de cabelos loiros, fitava o irlandês limpar a sujeira da calça.

“Ele queria me devorar.”, ele respondeu fazendo uma careta ao dizer isso e eu deduzi que “devorar” deveria ser alguma gíria irlandesa para “dar uma surra”, mesmo que minha mente tentasse concluir que Garrick seria capaz de devorar qualquer coisa. “Estou em dívida com você”, ele anunciou com um olhar momentaneamente subserviente, que me fez logo negar aquilo com um movimento de cabeça.

“Apenas fiz o que era certo.”, respondi com um senso de honra que pareceu nascer de mim tão fundo que eu estranhei o tom pomposo como eu falara aquilo, mas o irlandês pareceu ignorar o que eu dissera. Ele parecia ávido por pagar a dívida que tinha comigo, como se estar em débito o perturbasse completamente.

“Tome.”, ele disse, tirando do bolso e entregando a mim um broche feito do ouro nascido dos próprios raios do sol, entalhado com pequenos cristais de água do mar, com desenhos ornados de estrelas e flores a desabrochar. “Conte sempre com a ajuda de Knutbark”, ele disse com um sorriso franco e se afastou enquanto eu me perguntava se Knutbark era alguma divindade do folclore irlandês, mas quanto mais eu pensava no nome, mais me vinha à cabeça a figura de Niall. Não o Niall que eu acabara de ver exatamente, mas uma imagem diferente que, ainda assim, eu sabia ser do estudante irlandês.

Dei de ombros e abri a mão para fitar o presente que ele me dera como agradecimento. Ergui a sobrancelha ao ver ali nada mais do que uma simples borracha escolar branca. Talvez fosse alguma tradição irlandesa agradecer às pessoas dando-lhes uma borracha. Ou talvez o garoto fosse tão estranho quanto eu acreditava que ele era.

O resto da manhã pareceu correr como deveria, embora eu tivesse a impressão que eu não deveria estar vendo certas coisas. Vez ou outra eu percebia certo brilho dourado sobre minha mesa e quando eu focava o olhar tudo que via era a borracha que Niall me dera. Pensei ouvir o resfolegar baixo de algum cavalo perto de mim, mas sempre que eu olhava em volta não havia nada. Na aula de literatura eu podia jurar que via os demais alunos da turma adquirindo as feições das personagens quando liam suas falas na leitura em voz alta da Prof.ª Flack. Da mesma forma eu podia ter certeza que as caixas mal feitas fabricadas na aula de trabalhos manuais pareciam muito mais fantásticas ou elaboradas do que realmente eram e uma, que eu sabia que não era mais do que quatro peças de madeira muito mal pregadas, aos meus olhos parecia ser uma linda caixa de joias ornada a ouro com uma mínima bailarina de cristal a rodopiar em sua tampa. Conforme a hora do almoço se aproximava, mais eu tinha certeza de que precisava de um psiquiatra. Com urgência.

Os únicos momentos de pura lucidez que eu tive foram na aula de Ciências Políticas do Sr. Cowell. E isso decididamente não melhorou meu humor. Na verdade, enquanto estava naquela sala, eu sentia falta das alucinações que visitavam minha mente, ouvindo-o falar de política e dando explicações completamente banais para tudo que acontecia, desestimulando os alunos sempre que eles davam alguma resposta. Por mais que eu ali me sentisse mais preso à realidade, ao mesmo tempo sentia como se algo frio penetrasse pela minha pele e corroesse lentamente a minha alma.

Eu agradeci aos deuses quando o sinal tocou, encerrando aquele tempo de aula. Eu nunca saí tão desesperado de uma aula, como se o ar me faltasse e só longe do Sr. Cowell eu pudesse encontrar novamente o oxigênio que meus pulmões exigiam. Eu estava tão distraído andando a esmo para o refeitório que quase tomei um susto quando um braço tomou o meu para si, como uma garota ao se deixar conduzir por um rapaz para a pista de dança. Ergui as sobrancelhas ao encarar o rosto sorridente e cínico de Louis Tomlinson.

Louis era meu melhor amigo desde quando eu tinha quatros anos de idade. Como éramos amigos? Essa é uma grande questão. Eu sempre fui o garoto quieto e sério da rua onde morávamos enquanto Louis era o menino brincalhão e astuto que sempre apontava alguma coisa. E sempre dava um jeito de me envolver naquilo. Éramos tão diferentes que por vezes eu tinha a sensação engraçada de que nos completávamos. Devido aos problemas que vivíamos causando com nossas estripulias, meu pai considerava Louis uma péssima influência e deu graças a Deus quando ele e sua família tiveram de se mudar para uma casa menor do outro lado da cidade. Mas isso pouco importou para gente, já que continuávamos a estudar na mesma escola – ainda que Louis fosse um ano mais velho – e passássemos a nos visitar com frequência. Meu pai passou a amaldiçoar o dia em que ele tinha se mudado depois disso. Preferia a presença desconcertante de Louis aprontando comigo na rua do que dentro da casa dele, ainda mais porque o Tomlinson fosse o maior fã da “ridícula colagem de desenhos bobos” que havia no meu quarto.

“Não se esqueceu do que prometeu para mim hoje, não é?”, ele perguntou com um sorriso de quem aprontava algo enquanto se abraçava ao meu braço. Depois ele ainda se perguntava por que o povo da escola achava que éramos gays.

“Claro que não, Louis.”, eu lhe respondi, lembrando de como ele me fizera prometer que ajudaria na montagem de mais uma peça que ele estrelaria. Ele era, desde que eu me lembrava, fascinado pela arte de fingir ser, motivo pelo qual ele não me causou espanto nenhum quando disse que entraria para o clube de teatro. E, como ele sabia que eu entendia bastante sobre técnicas de iluminação e acústica, vinha se tornando cada vez mais frequente que ele me pedisse favores para o clube. “Eu estarei lá logo que terminar de almoçar”, completei a resposta logo em seguida. “Qual peça mesmo que vocês vão encenar?”

“Uma adaptação de 'Alice no País das Maravilhas'.” Ele respondeu com um sorriso animado enquanto eu pensava no quão irônico aquilo era. Eu mesmo me sentia como se houvesse fumado um bom trago do narguilé da Largata Azul. “Nos vemos depois do almoço, então.”, ele sorriu e se afastou e eu demorei algum tempo para esboçar uma reação quando ele me deu um beijo na bochecha.

“Ei, você não vai almoçar?”, perguntei intrigado, ao que ele me respondeu tirando do bolso uma cenoura e acenando para mim. Era engraçado como ele tinha uma estranha preferência por cenouras.

Atravessar a porta do refeitório foi a mesma explosão de ruídos e cores de sempre. Só que mais intensa. As fofocas do dia zumbizavam, voando sobre as cabeças dos alunos e os planos para o fim de semana que se aproximava corriam aos saltos por entre as pernas das pessoas. O gosto industrial do pudim da sobremesa era sublimado ao se provar a primeira colherada do manjar feito das maçãs do crepúsculo que ele se tornava na boca das pessoas mais imaginativas. Um simples suco de soja com sabor de uva, tornava-se o mais ébrio e fino vinho envelhecido no tronco da árvore da vida enquanto a taberna se tornava o ponto de reunião dos cavaleiros armados do time de futebol, que vinham do campo que se tornara uma floresta repleta de ogros, onde eles impressionavam as donzelas nobres da torcida.

Quando fechei a porta atrás de mim, o apetite completamente dizimado ao ver os sorrisos sanguinários de Garrick e seus companheiros, também trajando barretes vermelhos, direcionados para mim, decidi que era melhor esquecer tudo aquilo e ir logo para o auditório ajudar Louis como eu lhe prometera. Precisava de um lugar mais calmo naquele instante e, talvez, a sala onde eu me isolava no auditório enquanto mexia nas mesas de som e iluminação me ajudasse a por as ideias no lugar. Apenas me iludi ao achar isso.

Ao adentrar o auditório, eu não me vi mais na escola onde eu estudava. Havia céu azul acima do palco e para além dele montanhas e vales se abriam para o infinito do horizonte onde o sol se punha. Homens-carta se agrupavam e discutiam rindo, tão finos como uma folha de papel. A Rainha de Copas trazia nos olhos a loucura do poder, prestes a cortar a cabeça de alguém, e a Lebre de Março ria com toda a falta de sanidade que parecia me dominar. O Chapeleiro Louco, trajando um chapéu cujas abas púrpuras giravam de maneira desordenada, conversava a um canto com o Gato de Cheshire, cujos chifres de bode se pronunciavam tão claramente que mal podia acreditar que se tratava de um gato e não um bode vestido de felino. Sob minha pele algo ardia, como se uma força quente e poderosa tentasse se libertar de uma prisão. Demorei demais para perceber que não era minha pele que ardia. Era eu. Minha mente. Era como se ela estivesse prestes a explodir e se estilhaçar de vez.

Virei-me assustado e eu devia estar extremamente pálido porque o Coelho Branco me encarava de perto com os olhos arregalados, preocupado comigo. Ele estava ali, tão ao alcance das minhas mãos que eu podia ter certeza de que se tratava de um coelho de verdade. Eu podia ver os pelos brancos e as íris avermelhadas e não havia como eu duvidar do que meus olhos enxergavam. Era realmente um coelho ali. Minha mão avançou tão rápido quanto meus dedos se fecharam em torno da orelha do Coelho, quente e real como deveria ser.

“Ai! Para, você vai estragar meu figurino!”, Louis protestou e eu percebi de repente que tudo que eu segurava era um acessório cênico que imitava muito mal a forma que orelhas de coelho deveriam ter. Meu melhor amigo tirou as orelhas de sua cabeça e tentou desamassar o que eu fizera, enquanto me olhava com uma expressão mais do que preocupada. Era como se tivesse pena de mim. “Liam, você está...”, mas ele nunca chegou a terminar a pergunta, pois eu saí correndo dali. Precisava fugir para longe de tudo. Precisava de algum choque de realidade.

Corri e só parei quando não havia mais fôlego em meu pulmão. Sentei no chão e demorei a perceber que havia lágrimas em meus olhos. O corredor dos armários parecia normal e deserto, mas minha mente parecia ter entrado em guerra consigo mesma, como se duas partes de mim disputassem para decidir quem dominaria, realidade ou alucinação. Enfiei a mão no bolso e tirei de lá a borracha que Niall me dera, tentando ver nela uma borracha, mas tudo que meus olhos compreendiam era o broche de ouro que me fora entregue por Knutbark. As coisas se tornavam cada vez mais complicadas de serem entendidas, mas cada vez menos meu cérebro parecia exigir uma explicação. Ouvi passos, mas sequer me dei ao trabalho de erguer os olhos. Sabia que deveria ser Louis que me seguira desde o auditório para ver se eu estava bem.

“Você ainda não percebeu, não é?”, a voz, entretanto, não era a de Louis. Harry Styles, o principal ator do clube de teatro da escola, olhava para mim com curiosidade e um sorriso enigmático digno da fantasia de Gato de Cheshire que ele trajava. O garoto sempre tinha aquela expressão marota e despreocupada, como a de alguém que está na vida para viver e aproveitar cada segundo sem pensar no amanhã. Ele era o tipo de pessoa que perde o amigo, mas não a piada.

“O que eu não percebi?”, eu perguntei a ele sem entender o que ele quisera dizer, mas ele apenas acenou negativamente com a cabeça, como quem ri de alguma anedota particular.

“Até mesmo o mais bravio dos guerreiros, ao despertar, é como a borboleta a sair da crisálida.”, ele enunciou com um tom de voz que remetia a algum tipo de saber ancestral, tecido pela experiência das aventuras de várias vidas, “Ela deve alçar sozinha seu primeiro voo, sem ajuda, senão morrerá assim que bater as asas.”, ele completou e se despediu sorrindo. E mesmo que eu quisesse evitar, enquanto ele se afastava de mim, pude ouvir claramente o som de cascos batendo contra o piso de linóleo do corredor.

As horas que se seguiram passaram como um borrão de cores, luzes, formas e cheiros que não existiam. Voltei para casa mais cedo do que o normal, lutando para manter minha mente ligada à realidade para não me chocar com algum carro enquanto pedalava pela estrada velha. Minha mãe e Ruth pareceram perceber que havia algo de errado quando cheguei em casa, mas eu não podia ficar perto delas, pois a imaginação que lhes escapava pelas orelhas ganhava formas diante dos meus olhos. Nada mais pude fazer que me trancar no quarto e me esconder sob a coberta, ocultando-me dos meus próprios sentidos, que eram o que eu mais temia. Eu lutava desesperado contra os gritos de guerra e os urros que partiam dos desenhos que criavam vida diante da minha cama, tentando não ver os brilhos coloridos das armaduras que se refletiam sobre o tecido da colcha sob a qual eu buscava refúgio.

Eu me agarrava ao tecido de lã, como quem se agarra desesperadamente a um bote de salvamento chamado razão. A sanidade me escapava entre os dedos conforme a luz do dia escapava através do pôr-do-sol vermelho que invadia, em convite, meu quarto pela janela, tentando desafiar minha resistência vã às alucinações para me levar de vez ao mundo do impossível.

Foi quando eu o ouvi.

O relinchar alto como um trovão correu a casa toda e me fez ter a sensação de que o assoalho inteiro se sacudia, como que pela ação de um terremoto. Os desenhos se silenciaram na parede, como se a expectativa que aquele som causara os congelasse no tempo. A luz rosada que cruzava minha janela parecia muita vezes mais intensa do que a luminosidade normal do fim do dia. Era como se o sol poente estivesse parado em meu jardim a me esperar. E ele me chamava com outro som que pareceu sacudir minha consciência. Aproximei-me da vidraça e pude ver, lá embaixo, ele a me esperar. Eu o havia conhecido naquela manhã, mas sabia que ele me pertencia. A pessoa que me dera ele fora bem clara.

“É para você”, Ruth me dissera e eu tinha certeza de que podia confiar nele. Nada que minha irmã houvesse feito para mim iria me ferir. Não sei exatamente como eu saltei pela janela do terceiro andar e parei de pé, intacto ao lado dele, mas sabia que naquele instante meus dedos acariciavam o pelo macio como a relva das Terras do Sem Fim daquele unicórnio que brilhava com a cor rosada do crepúsculo. E foi como se eu soubesse o que fazer naquele momento. Ele fora feito para que eu o cavalgasse. E era meu dever. naquele instante, montá-lo.

Cruzamos a trilha da floresta em tal velocidade que sequer o carro novo que meu pai tencionava comprar poderia nos alcançar. As árvores ao nosso redor aos poucos iam se parecendo mais com grandes pilares de luz e vida, iluminados com lâmpadas de cores em forma de flor que subiam por elas como ramos de erva. Avançamos pela trilha para além do ponto onde eu encontrara Zayn por acaso, invadindo o coração da floresta, cruzando o vento que tinha o aroma doce das aventuras e da terra a ser desbravada. Minha alma parecia se iluminar conforme eu sentia outras luzes arderem pela floresta, todas confluindo para o ponto ao qual eu me dirigia com minha montaria fantástica. Era como se todos compartilhássemos a mesma natureza e a mesma matéria.

O unicórnio trotou e parou à margem de uma clareira, cujos limites eram claramente delimitados por uma série de pequenos cogumelos que pareciam dotados de alguma magia sobrenatural. A forma perfeitamente circular se impunha aos meus olhos e eu sorri ao reconhecer do que se tratava. “Um Círculo de Fadas...”, sorri e caminhei lentamente para onde a festa se principiava.

Pontos de luzes coloridas ziguezagueavam pelos ares, se chocavam e explodiam em pequenas cascatas de fogos de artifício, que se recompunham e voltavam a cruzar o céu como estrelas cadentes. A música das eras ressoava, como se vinda de todos os lados, como se não só os tambores e instrumentos feitos de luz e sonhos a entoassem, mas também as próprias almas da árvores que pareciam despertar de um sono secular e bailavam à margem da clareira. O cheiro característico das sobremesas feitas da nata da via láctea invadia minhas narinas, trazendo-me recordações de cantorias heroicas regadas a hidromel extraído diretamente do Grande Carvalho da Vida.

Por todos os lados, seres fantásticos cantavam seus cantos e bailavam suas danças, criaturas que a humanidade pensara terem sido esquecidas, mas que viviam entre eles sem que percebessem. No rosto de cada fada ali presente eu reconhecia de algum modo alguém que eu já vira no mercado, na rua ou em qualquer lugar comum, pessoas que pareceriam ordinárias se não fossem seus sorrisos sinceros e o brilho sonhador de seus olhos. Knutbark, o Boggan – ou fada doméstica – que eu salvara mais cedo de ser devorado por um Redcap me cumprimentava com seu sotaque irlandês enquanto pegava do meu bolso o broche que me dera e afixava em meu peito. Trickpoof, o Pooka que era meu amigo de infância, oscilava entre a aparência mais humana e seu rosto de coelho branco e sorridente enquanto comia mais uma de suas cenouras, como se o êxtase por me ver fosse grande demais para que ele conseguisse manter uma única forma. No meio dos celebrantes Eufranor, o Sátiro que era o Gato de Cheshire da peça da escola, acenava para mim enquanto tocava em sua flauta as delícias de viver no Sonho.

Todos celebravam por um motivo especial. Comemoravam mais um pedaço do Sonho que se juntara novamente ao convívio deles, mais uma das fadas que despertara enfim do casulo de mortalidade em que se escondera para se proteger da fria e cruel descrença das pessoas, da banalidade do mundo. Festejavam por mais um fio de esperança que se adicionara à teia dos sonhos, por mais um irmão perdido que se juntava a eles para manter viva a memória e a existência de todas as fadas do mundo. Aquela festa era para mim.

“Quem é este que se adentra o Domínio de Lord Quinn du Adalrich?”, o nobre Sidhe que eu sabia ser Zayn estava sentado em seu trono vivo, feito de uma árvore nascida da semente das estrelas, posto na posição de destaque na festa. As vestes tecidas de sol e estrelas dele brilhavam quando me aproximei e me pus de joelhos a seus pés. “Dize teu nome, guerreiro, e deposita em mim o voto de confiança que em ti depositei ao te permitir entrar em meu Domínio”, ele disse em sua voz soberana de nobre fada enquanto eu me sentia maior do que jamais fora, mais forte do que jamais me sentira, a pele azul refletindo a luz do fim do dia sob a armadura de ossos de dragão que eu sempre trajara sem o perceber.

“Eu sou Killian, meu Senhor, portador da Lâmina do Luar.”, a espada que desembainhei foi posta por mim aos pés de Lord Quinn, enquanto eu lhe prestava uma reverência. “O Matador dos Lobos de Eurie, Aquele que cavalga o Vento Leste, e venho a vós prestar-me a vosso serviço, Milorde.”

“Que assim o seja, Sir Killian.”, assim ele me reconheceu como seu servidor e cavaleiro, dando início às festividades que comemoravam a filiação de um novo guerreiro Troll às armas de Lord Quinn. A música e a festa se estenderam noite adentro, os sons da fantasia avivando a floresta enquanto os humanos dormiam sem suspeitar de nossa comemoração secreta, ou sequer de nós, que guardamos seus sonhos.

A partir daquele dia em que eu me lembrei de quem era, não precisei mais fugir de alucinações. Não me senti mais oprimido pela descrença fria e desoladora de meu pai ou do Sr. Cowell. Não precisei mais me preocupar com a possibilidade estar enlouquecendo, pois eu sabia que não estava. Eu sabia quem eu deveria ser.

Eu era Sir Killian, um Troll, uma fada guerreira que, quando as ligações entre o Sonho e a humanidade se romperam, ingressou no caminho changeling para sobreviver à Banalidade do mundo mundano, inserindo minha alma fada em um casulo de carne mortal, compartilhando corpos com mortais, renascendo através das gerações para manter o Sonho vivo. Era era um pedaço da magia da imaginação humana, um filho do Sonho. Era mortal e imortal, feérico e humano, vivendo entre dois mundos distintos e ligados sem que as pessoas sequer pudessem desconfiar. E agora eu poderia escolher o melhor deles.




"Às vezes eu penso em uma cidade. E em caixas de concretos onde pessoas sem perspectiva vivem vidas sem sentido ou emoção, seguindo caminhos que jamais escolheriam para si se algum dia houvessem sonhado com o mundo de maravilhas que poderiam encontrar se apenas assim o quisessem. Essas pessoas nada mais são que sombras do que poderiam ter sido, marcas de solidão e uma descrença desesperante projetadas na parede. Esqueceram a beleza do mundo, perderam a vontade de viverem e serem livres. Presas a destinos que não escolheram, fabricados como as latas de comida industrial que consomem com sonhos vendidos em caixas de metal, vidro e plástico. Sonhos não foram feitos para serem vendidos, ou para jazerem presos em caixas frias e sem vida. Tais pessoas esqueceram a alegria que tinham quando, ainda pequenas, contavam e ouviam histórias sobre tempos imemoriáveis e aventuras impossíveis. Perderam a fé no inacreditável. Esqueceram como sonhar.

Por isso me alegro ao fechar os olhos. Pois posso sonhar. Não sou um deles."



6 de maio de 2012

Concurso II/2012: "Verso, Refrão, Verso"

Título: Verso, Refrão, Verso.
Autor: acid.
Beta: amber.
Categoria: Concurso NFF II/2012, Embriaguez; Projeto Need for History, Birdsong. POV em Segunda Pessoa, Missing Scene, Stephen Wraysford/Michael Weir.
Advertências: Spoilers do livro/minissérie, Slash, Angst.
Classificação: R.
Capítulos: Oneshot.
Completa: [x] sim.
Resumo: Michael Weir partiria o seu coração, se você tivesse um.

A guerra é tudo e nada como você achou que seria.

Existem, obviamente, pessoas morrendo. Todos os dias, a todo maldito momento você vê pessoas morrendo – homens, meninos, heróis e covardes. Nunca é justo, você aprendeu. Você também aprendeu que é besteira se importar com cada um deles; que a sua frieza e a falta de sentimentos, defeitos que te acompanharam por toda a sua vida, são qualidades ímpares em uma guerra.

As pessoas morrem a sua volta o tempo todo, e você descobriu que não há nada de extraordinário ou místico sobre a morte: Em um momento você está respirando, e no momento seguinte você não está mais. Vocês são britânicos sendo atacados por alemães em território francês porque vocês precisam impedir o avanço econômico alemão ainda que o preço a se pagar por isso seja destruir o próprio avanço nacional, e você podia continuar divagando a respeito disso por horas a fio apenas para chegar à única conclusão que você sempre soube: Nada disso faz o menor sentido. Exatamente como você esperava.

Os tiros são ensurdecedores, cada estrutura destruída por um bombardeio parece ecoar no vazio debaixo das suas costelas, você não sente nada quando aponta o seu rifle para um inimigo e rouba a vida dele. Verso, refrão, verso. Você sabe como as coisas funcionam.

Você se lembra do antes – de quando você era Stephen Wraysford, e não havia um Tenente antes do seu nome. Você gostava de não saber como as coisas funcionavam, não saber qual era a sensação de ter o sangue de outra pessoa te manchando, de não saber qual era o som de corpos se despedaçando ao longe. Você não se importa, agora, mas você gostava de quando você era o tipo de pessoa que se importaria. Mas isso foi antes, e você não pensa nisso. Você não pensa em como você já teve um coração, e em como ela – não ela, a guerra, mas ela, Isabelle – arrancou-o do seu peito. Você não pensa nela.

Você nunca pensa nela, e você é Tenente Stephen Wraysford.

O que você se permite fazer, às vezes, é tentar descobrir quando foi que você deixou de pensar nela. Você não sabe, porque quando Isabelle fugiu com você a sua vida estava perfeita e completa subitamente. Não havia nada mais a se fazer a não ser vivê-la, porque Isabelle era tudo o que você queria e ela jurou que você a fazia feliz. Você acreditou, por que você não acreditaria?, e ela enfiou todos os pertences dela em uma maldita mala e te deixou, sem nem se despedir, pedir desculpas, gritar com você, nada. Ela enfiou os malditos pertences dela em uma mala e voltou para o marido dela, de quem você a tinha salvo.

Você sente sua garganta arder com a risada amarga que toda essa ironia te arranca, e você sabe que o olhar de Weir cai sobre você, do outro lado do quarto. Você se revira na cama, encarando o teto para não ter que olhar para ele. Você não pode lidar com ele agora.

Sim, então houve aquele período na sua vida em que você teve que aprender a se manter em pé sem um coração. Foi fácil, você precisa admitir. Mais fácil do que ter um coração, você percebe hoje, e talvez você até agradeça por isso a alguma força maior quando você acordar se sentindo religioso. Quer dizer – foi fácil, até você começar a se preocupar com ele.

No início, você achou que não podia existir uma pessoa mais inapropriada para essa guerra do que Michael Weir. Ele usava suéteres de lã por cima da camisa da farda, calçava tênis brancos de civil, os cabelos curvavam-se em cachos perfeitos de cor cobre. Weir ficava inquieto quando ouvia tiros ao longe, as mãos dele tremiam convulsivamente a cada menção a um irmão-de-armas morto, os olhos dele se enchiam de lágrimas a cada notícia de um novo massacre – francês, inglês ou alemão.

Você entende a razão de ele estar aqui, ostentando um título de Capitão antes do nome; ele é inteligente, um engenheiro escocês simplesmente brilhante, que nunca falhou em conseguir o esquema perfeito para cavar os mais improváveis túneis em terreno hostil para dinamitar o inimigo. Ninguém mais faz o que ele faz, e você sabe disso.

Você entende a razão de Michael Weir estar aqui, nessa guerra. O que você não entende é como tiveram coragem de olhá-lo nos olhos – aqueles olhos azuis e grandes e brilhantes e vivos, livres de qualquer mácula – e jogá-lo nesse inferno.

“Wraysford,” ele te chama, cortando o silêncio. Você ainda não quer lidar com ele – basicamente porque você não pode lidar com ele; você não tem um coração, você não tem tato, você não tem misericórdia.

E você tem medo de quebrá-lo.

Você se ergue da cama, atravessa o cômodo sob o olhar inquisitivo dele, puxa uma cadeira para você à mesa precária onde ele está bebendo. A garrafa de whisky está pela metade, você percebe enquanto se serve, e as pálpebras dele já estão pesadas de embriaguez. Ele fecha os olhos com força, aperta os próprios braços contra si, encolhe-se na cadeira. Weir já não tenta esconder essas coisas de você, e às vezes você se pergunta o que foi que você fez para merecer a confiança dele – você não acredita em nada, não se importa com nada, não é gentil com ele. É mais uma das coisas que, nessa guerra, não faz nenhum sentido.

Mas você se importa com ele. Deus te ajude, nada disso faz sentido.

“Você acha que Douglas—” ele começa, mas se interrompe para soltar uma grande lufada de ar, soltando os braços densamente sobre a mesa. Você percebe que o bombardeio, ao longe, cessou. “Você acha que ele... Que Douglas sofreu muito?”

As mãos dele tremem quando ele apanha a garrafa de whisky, e o som de vidro se chocando contra vidro é estranho e repentino e não pertence ali. Você leva o seu próprio copo aos lábios, sentindo o álcool te queimar por dentro. É claro que ele sofreu, você estava lá, você o viu, é o que você quer dizer. Ele estava lá, caído, com as costelas abertas e o maldito coração batendo, é claro que ele sofreu. Mas você olha para Weir, os olhos cheios de esperança gritando mente pra mim, mente pra mim, mente pra mim, e sabe que não vai conseguir negar isso a ele.

Ele vai acabar se quebrando, mais cedo ou mais tarde – essa guerra, algum oficial, o mundo fora daqui que vocês não conhecem mais. Você.

Você faz isso com as coisas que você ama. Você as protege de tudo, tudo, só para poder quebrá-las com as próprias mãos. E cada medida que você toma para protegê-lo, prova que você está certo. Verso, refrão, verso. É inevitável – você vai quebrá-lo.

Pior, é inegável – você o ama.

A sua garganta ainda te incomoda, então você termina o seu whisky e puxa o seu maço de cigarros do bolso. Weir te passa a caixa de fósforos prontamente, e você observa as suas próprias mãos tremerem quando você aciona a chama que inflama o cigarro pendurado entre seus lábios. Você está bêbado, é o álcool. Só o álcool.

Nunca medo.

“Não sei,” você responde, com a voz rouca por causa da fumaça. “Ele estava tentando falar, mas não sei dizer se ele estava consciente.”

“Ele era um garoto, só um garoto...” ele diz, as palavras se enrolando no nó que prende a garganta dele, no álcool, no choro.

Você também é, você quer dizer. Você quer dizer que ele é mais frágil e precioso do que qualquer um dos garotos, que quando você ajudou Douglas a morrer, você olhou no rosto delirante dele e imaginou o de Weir – alvo e imaculado e vivo, e imaginá-lo morrendo impediu o ar de chegar aos seus pulmões, e você não sabe o porquê. Ou você sabe, mas preferia não saber.

“Esquece isso, Weir.” é o que você consegue dizer, e você desvia os olhos dele e volta a tragar o seu cigarro, esperando que você também esqueça.

“Não consigo,” ele torna, e você ouve a cadeira dele se arrastar pelo assoalho, os passos leves dele fazendo o chão vibrar ligeiramente. “Ele—Wraysford, o que nós estamos fazendo? Matando crianças, fazendo pessoas sofrerem, o que nós estamos fazendo?

Você não sabe como ou por que acontece – se foi o tom trêmulo e quebrado da voz dele, se foram as lágrimas que ele não conseguia conter, se foram as malditas perguntas dele que não tinham resposta. Talvez tenha sido você, mesmo, sem saber como lidar com essa afeição estranha que você sente por ele. Você não sabe. O que você sabe é que você se levanta da cadeira, abandonando o seu cigarro, o seu whisky e o seu bom senso, e segura Weir pelos braços, empurrando-o até o armário atrás de vocês porque você quer que doa. Deus te ajude, você quer que doa.

“Eu não sei,” você responde, com raiva. Você consegue sentir o medo emanar da respiração dele, do jeito que ele treme, do olhar perdido dele, e você o empurra com força outra vez só porque você pode. Weir só te olha – ele não reage, não te manda parar, não pergunta o que você está fazendo, tenta te bater. Nada.

O nada te lembra de Isabelle – de como tudo era tudo, e de repente passou a ser nada.

Você odeia o nada.

“Eu não sei,” você repete, mais alto e mais claro e você aperta o braço dele com mais força porque você não sabe o que você é capaz de fazer se ele não reagir. Você precisa que ele lute com você, e te amaldiçoe com todos os nomes que você sabe que merece, que ele te prove que ele não é puro como ele parece ser. Você precisa que ele grite com você e te mande sair, porque você não sabe o que você pode fazer se você continuar aqui.

Você tem a sua reação – a mão dele segurando firme a gola da sua camisa, te puxando contra ele com força, enterrando o rosto no seu peito – e você não sabe exatamente o que fazer com ela. É absurdo, você pensa, enquanto inconscientemente solta o aperto no braço dele. Você ouve a respiração dele diminuir, procurar o ritmo normal, e as mãos dele te seguram com tanto desespero que ele partiria o seu coração, se você tivesse um.

Porque você não tem um coração. Essa coisa martelando em seu peito como se quisesse te matar é só um fantasma de uma coisa que, um dia, existiu, e você odeia Weir por isso. Ele não é como nada que você conheça; ele não é verso, nem refrão, nem verso.

Ele ergue os olhos para te encarar, e você não merece nenhum dos sentimentos que brincam nos orbes cor do céu dele; a inocência e a gratidão daquele olhar te queimam, deixam marcas e fazem coisas com você que você se recusa a entender, e é por isso que você cola seus lábios aos dele.

Não tem nada a ver com essa necessidade louca que você sente de fazer as lágrimas dele cessarem, ou de calar os soluços dele. É porque o olhar dele é insuportável, e não porque você quer sujá-lo com as suas próprias mãos só para que o mundo não leve o crédito por isso – ninguém além de você pode levar o crédito por isso.

Então, é tudo culpa do olhar insuportável dele. E do álcool.

Nunca da sua vontade de roubá-lo dessa guerra e quebrá-lo você mesmo.

Weir tem gosto de redenção, de algo puro e intocado, de algo que você nunca deveria ter feito. Ele tem gosto de vida, de algum sentimento que um dia você conheceu e que hoje está distante demais para que você se lembre. Ele tem gosto de algo sagrado, e você não seria você se ignorasse essa vontade incontrolável que você sente de corrompê-lo.

Você desenha a cintura dele com um braço, sentindo o beijo dele queimar em sua língua como um lembrete de que esse é o seu maior pecado enquanto as mãos dele ainda tentam se firmar nas suas roupas, como se ele não confiasse nas próprias pernas para se manter em pé. A boca dele se abre desajeitadamente sob a sua e você se lembra de quando ele te disse que ele nunca teve ninguém, ele é só seu para corromper. Ele nunca teve ninguém, e você não vai conseguir parar – o arrepio indecente tentando reduzir a sua espinha a pó deixa bem claro que você não vai conseguir parar.

“Eu não consigo—Wraysford,” ele começa, os lábios movendo-se sobre os seus, as lágrimas dele molhando o seu rosto, fazendo você se perguntar há quanto tempo você não sente as suas lágrimas molharem o seu rosto. Você não tem uma resposta. “Eu não consigo esquecer, me faz esquecer. Por favor, me faz esquecer...”

Você segura o rosto de anjo dele com uma mão e diz que sim com a cabeça porque você pode fazer isso, você pode fazê-lo esquecer. Você pode invadir a boca dele com a sua língua e empurrá-lo até a cama e roubar a inocência dele e quebrá-lo em tantos pedaços diferentes que ele não vai conseguir se reconhecer depois, quem dirá se lembrar de alguma coisa – isso você pode fazer. E você pode se convencer de que é tudo pelo bem dele, ele pediu, e não porque você é um desgraçado egoísta que sente essa necessidade absurda de marca-lo como seu, de alguma forma. Talvez, se você conseguir se convencer de que é pelo bem dele, você até durma à noite.

Mas não é do seu feitio tentar se enganar, assim. Não, você quer poder olhar nos olhos azuis corrompidos dele, quando tudo acabar, e sentir o seu peito se encher de orgulho porque foi obra sua.

De mais ninguém.

As suas mãos desprendem o cinto e os botões da calça dele sem gentileza, e você deixa os seus dedos roçarem na pele macia descrevendo o abdômen dele com reverência – ele deixa um gemido baixo escapar entre o beijo e você não sabe como ou se faz algum sentido, mas é a coisa mais excitante e preciosa que você já ouviu. Você sente raiva de si mesmo pelo dia em que teve a ideia de levá-lo até aquela cortesã, e chega à conclusão de que você não é melhor do que nenhum dos oficiais que olharam Weir nos olhos e jogaram-no nessa guerra.

Você olhou Weir nos olhos e jogou-o nos braços de uma mulher qualquer, só para que ele perdesse a inocência – a sua sorte é que ele não conseguiu. Os lábios dele não responderam aos dela, as mãos dele não se seguraram às vestes dela em desespero, a garganta dele não gemeu por ela. Porque ele não quis, não porque você o salvou.

Não, você não é melhor do que os desgraçados que jogaram Weir nesse lugar. E é porque você ainda deve ter algum resquício de dignidade e de capacidade de amar que você se afasta dele e desiste de quebrá-lo.

A respiração dele está ofegante – por sua causa, não por causa do bombardeio ou porque ele viu alguma coisa horrorosa – e os lábios dele estão inchados e abertos. Os olhos dele nunca estiveram tão azuis e nem tão inocentes, e você precisa respirar fundo para ter a certeza de que essa é a realidade antes de voltar as suas costas para ele, apanhar a garrafa de whisky quase vazia e encher o seu copo abandonado.

Você ouve Weir respirar fundo também, se afastar do armário e caminhar até a mesa lentamente. Ele não está mais tremendo, você repara quando ele apanha o seu maço de cigarros da mesa e risca um fósforo para acender um para si, e isso deve ser um bom sinal, então você termina o seu copo cheio de whisky em dois goles porque você fez a coisa certa. Você fez a coisa certa mas você quase fez a coisa errada e não existe ar suficiente para vocês dois nesse quarto.

“Wraysford—” ele começa, a voz irregular por causa do álcool, ou de você, mas você o interrompe.

“Não diz nada. Não diz nada, Weir, fica quieto.” você pede, porque você não pode lidar com ele agora. Você não pode lidar com ele nunca, porque você não tem um coração, se lembra?

Eu esqueci,” ele diz, ignorando o seu pedido e sorrindo, como se estivesse tudo bem. Como se você não tivesse quase feito uma coisa horrível, como se isso tudo fosse normal. Como se fosse verso, refrão, verso. “Você disse que ia me fazer esquecer, e eu esqueci.”

Ele leva o cigarro aos lábios e traga profundamente, escondendo o sorriso que você sabe que está lá com os dedos, e você sente vontade de sorrir também, porque faz algum sentido, ainda que, talvez, seja só porque vocês dois estão completamente bêbados. Mas ele te pediu para fazê-lo esquecer e você fez e ele está inteiro. O gosto dele ainda está queimando nos seus lábios e você nunca sentiu tanta vontade de fazer algo proibido antes e ele está inteiro.

Você o ama, e ele está inteiro.

Alguém bate na porta e diz “ronda em dez minutos, Capitão” e você ouve Weir se levantar e arrumar as próprias roupas, vestindo o casaco da farda e apanhando o quepe em algum canto. Você não presta atenção, porque você só consegue pensar em como você o ama, e em como você não pode quebrá-lo, e em como você não tem um coração, e em como nada disso faz sentido.

Ele abre a porta e sai, e você fica pensando em como você costumava gostar do verso, do refrão, do verso.

Você gostava de saber como as coisas funcionam.


____________________


Vocês costumavam dizer que morrer com um tiro na cabeça, em plena guerra, era sorte. Uma morte rápida, limpa, indolor – do tipo que não deixa o alvo agonizando, e nem causa muito horror aos irmãos-de-armas.

Você acreditava nisso, de verdade. Que seja um atirador de elite, que seja um atirador de elite, você pedia todas as vezes em que se via à beira da morte. E não foram poucas – você não é um engenheiro, um sapador, um minerador. Não, você é um tenente de infantaria, um maldito tenente de infantaria, como você continua vivo quando ele está morto?

Ele está morto.

Michael Weir está morto.


Uma morte limpa, te disseram. Um tiro na cabeça, ele deu sorte. Verso, refrão, verso. Você consegue conter a risada amarga que arranha a sua garganta, mas não há nada que você possa fazer para impedir as lágrimas que você sente se formarem em seus olhos, nem a dor estranha debaixo das suas costelas. Você não tem um coração, essa dor que você sente dilacerar o seu peito é um fantasma. Só um fantasma, como ele.

Michael Weir está morto, e vai ser enterrado com algumas medalhas presas ao peito e, se encontrarem, uma bandeira enrolada no caixote que vão chamar de caixão. No meio de um deserto que vocês criaram, em algum lugar que Deus baniu. Mais tarde ele vai ter o nome entalhado junto de milhares outros em algum monumento hediondo e vão rezar pela alma dele.

É bom que rezem. É bom que rezem porque ele deve estar no inferno, pelo que ele fez com você. Ele não deixou a cortesã roubar a inocência dele – ele ia dar a inocência dele pra você, ela era sua, e você teve medo. Ele te fez amá-lo, querer quebrá-lo, querer protegê-lo, querer—

Ele fez tudo, para se transformar em nada.

Você odeia o nada.

Michael Weir está morto – verso, refrão, verso. Você sabe como as coisas funcionam.

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Nesse bimestre ganhou uma fic que foi uma espécie de unanimidade entre os nossos leitores. Então prestigiemos uma escritora que já está fazendo sucesso há um tempo no fórum, e que esse mês teve seu talento reconhecido: acid


Need For Fic: Qual foi a sua inspiração para essa fic?
Na época em que o tema do concurso foi decidido eu estava em um estado de surto completamente insano por Birdsong. A adaptação pra televisão tinha acabado de sair, o livro já era uma das minhas obras favoritas e eu não conseguia pensar em outra coisa que não fosse uma fanfic com o Wraysford e o Weir bêbados. Eu precisava escrever alguma coisa com eles e o tema do concurso saiu tão perfeito que era absurdo e URGH, não consegui me conter. E eu escrevi tudo muito muito muito inspirada pelo clima das poesias ridiculamente perfeitas do Siken, então saiu essa coisa angst e doida e pois é. HAHA.


Need For Fic: Fale um pouco do livro que te inspirou a essa fic: por que devemos lê-lo?
Porque eu vou caçar cada infeliz que não leu, esquartejar e usar de tempero pro meu miojo. Não, sério, o mundo inteiro devia ler porque Sebastian Faulks é um escritor simplesmente brilhante, que definitivamente faz jus ao sucesso que a obra dele teve lá fora. O realismo dele é uma coisa rica e preciosa, e ele tem esse estilo descritivo lindíssimo que ele consegue impor para criar ambientes, cenas de amor ou de combates, sentimentos... E, preciso dizer, esse homem tem o dom de criar personagens complexos e trabalhá-los até eles partirem o seu coração. Um romance simplesmente incrível ♥


Need For Fic: Qual fandom você nunca escreveu, mas tem vontade de escrever?
Ai, senhor, são tantos! Eu tenho esse problema de ser uma escritora incrivelmente preguiçosa e insegura, então eu não escrevo muito. Mas quero MUITO escrever algo de Shameless US, que é a minha nova paixão, ou True Blood, que eu acompanho desde sempre e fico me mordendo de vontade de escrever, mas, sei lá o porquê, nunca consigo... Ainda tem o meu fandom mais querido do coração, Inception, que eu já nem leio mais nada, mas SEMPRE morri de vontade de escrever. Ah, sim, e as Crônicas Vampirescas, mas aí eu precisaria de muita coragem! HAHAHA.


Need For Fic: Fale um pouco sobre a sua trajetória antes e depois do NFF.
Não existe muita coisa antes do NFF, para dizer a verdade. Eu sempre li fanfics, claro, e nem sei dizer quando foi que essa loucura começou. Parece que eu nasci com esse vício HAHA. Tive a minha fase Pottermaníaca, e depois fui para o lado dos animes, que me fizeram ficar atualizando o FF.net diariamente, procurando feito doida atualizações dos meus autores favoritos. Depois eu meio que me afastei das fanfics, e quando voltei NADA era igual e eu vi em algum lugar um convite pro NFF. Me cadastrar foi meio que um tiro no escuro porque eu não conhecia ninguém e eu não sou a pessoa mais sociável do mundo, sério, mas foi a melhor coisa que eu podia ter feito. Conheci pessoas incríveis, autores verdadeiramente talentosos que fizeram com que eu finalmente me sentisse segura para publicar textos de minha autoria e SDKJFGLFBMFDF QUERO MORDER TODOS. Ahem.

Por fim, que mensagem gostaria de deixar para as pessoas do fórum?
UUURGH, isso é tão intimidador! Okay, primeiro, preciso agradecer à administração por ter tido essa ideia fenomenal que é o NFF. Ter um lugar onde pessoas lindas interagem e se sentem livres para postar fanfics de temas tão diversos é uma coisa realmente única, e eu me sinto muito sortuda por ter encontrado esse fórum. Além disso, queria dedicar uma mordida especial aos organizadores do Concurso porque essa é outra ideia brilhante, que nos permite conhecer autores geniais, obras incríveis e receber comentários que simplesmente significam tudo para um escritor, então, de novo, OBRIGADA. Ah, e também preciso dizer que eu queria muito apertar e morder e fazer miojos pra Nayla pra sempre, porque se ela não tivesse sido uma linda comigo eu nunca teria perdido o medo e postado uma fanfic aqui, e ela definitivamente foi a responsável por eu ter conseguido terminar essa fanfic do concurso, então muito obrigada. ♥ E agora, um beijo pra minha mãe, pra Xuxa e Sasha. SEUS LINDOS.
 

3 de março de 2012

Concurso I/2012: "Mia"

Título: Mia
Autor: Cahnove
Categoria: Concurso NFF I/2012, Morte/cena triste/separação, História Nova, Slash (M/M), POV
Advertências: Tentativa de estupro, loucura
Classificação: R
Capítulos: 1 (one shot)
Completa: [X] Yes [ ] No
Resumo: "Sabe? Lidar com a morte é bem mais fácil (...) quando se tem boa companhia."
N/A: Me foquei no tema Morte. Faz um bom tempo que não escrevo uma original, mas decidi arriscar, tratando a morte de uma maneira um tanto mais... Bem-humorada. E fantasiosa, é claro. Espero que gostem!

Capítulo Único

Lembro bem do dia em que você bateu na porta de casa. Eu morava num chalé afastado da cidade, decorado a dedo. Era confortável, calmo. Era tudo que um escritor precisava. Pelo menos, era tudo que um escritor da minha idade necessitava. Dia frio. Senti as juntas dos meus dedos doendo quando, de súbito, levantei da minha poltrona, abandonando o texto que antes escrevia com tanto afoito na minha companheira máquina de escrever. Soltei um xingamento bastante alto, me lembro. Odiava que me interrompessem. Juro que não sabia o que iria encontrar batendo-me à porta. Não sabia que iria te encontrar.

Tu sorrias com o sorriso mais bonito que eu já vira em anos e seus olhos brilhavam como se estivesses realmente feliz em me encontrar, mesmo que eu não tivesse idéia de quem tu fosses.

- Quem é você, meu jovem? – odiava colocar essas duas palavras no final de uma frase. Geralmente me faziam sentir mais velho do que eu realmente era. Mas elas sempre pareciam corretas. Por mais que me custasse admitir, eu estava velho. Os cabelos brancos enfeitavam minha nuca e, também, já começavam a cair. Todas aquelas rugas que marcavam meu rosto, os olhos que mal conseguiam ver de perto.

Você me chamou pelo nome e eu assenti, permitindo que entrasse. Dizia-se jornalista e procurava uma entrevista com um dos mais marcantes escritores do país. Não era a primeira e nem seria a última pessoa a tentar me enganar. Julgo que os jovens falham nesse quesito, julgando os mais velhos, como nós, ignorantes, achando que vamos acreditar em tudo que falam. Somos um pouco mais inteligentes que isso, meu caro. Mesmo assim, assenti. Tu eras deveras jovem para ser um jornalista, mas ignorei. Sentia falta de ter alguém na casa. Desde que... Ele havia partido, me sentia solitário. Afogava, então, meus sentimentos em rapazes jovens como "o jornalista".

Você fez uma série de perguntas sem fundamento. Fui tentando responder todas calmamente, assentindo de vez em quando, tentando dar a entender que estava interessado. Não estava, que fique bem claro. Estava mais interessado em memorizar cada traço de seu rosto, cada fio de seu cabelo, cada detalhe do seu corpo jovem.

- Sei que não é jornalista – murmurei depois de um tempo, interrompendo-o quando você finalmente iria me perguntar de minha opção sexual, coisa da qual nunca gostei muito de falar, apesar de aceitá-la completamente.

Ele pareceu confuso. Logo ficou vermelho de vergonha, se entregando completamente. Soltei uma risada calma e pedi para que não se preocupasse.

- O que desejavas vindo aqui? – perguntei, calmamente. Tu então olhas pra mim e diz que simplesmente não tinha lugar nenhum para ir. Clichê? Um pouco. Estou acostumado com essas desculpas, pois já ensaiei cada uma delas para colocar em livros, vendo se elas são convincentes. Preciso que minhas personagens sejam humanas, que saiam das páginas e venham sussurrar-lhe ao ouvido as palavras que eu coloquei em suas bocas.

Disse que precisava de alguém para me ajudar.

- Entenda – comecei dizendo – Sou um velho. Preciso de alguém para fazer alguns deveres para mim e me ajudar a pensar, de vez em quando. Geralmente discuto minhas idéias sozinho, mas ter alguém por perto seria... Perfeito.

Era uma oportunidade. Eu pagava bem, afinal.

Alguns dias depois, num final de tarde, comecei a escrever sobre a vida. É irônico o quanto as pessoas da minha idade, depois de terem quase toda a vida drenada do corpo, insistem em escrever sobre ela.

Respirei fundo. Desculpe se faço uma pausa aqui. Contar histórias que realmente aconteceram comigo me deixam um pouco nostálgico. Vês? Uma lágrima caiu de meus olhos, apenas porque estou olhando esse maldito túmulo. Penso, agora, qual a razão de ficar contando essa história daqui, no cemitério, se ele apenas traz péssimas lembranças?

Voltando... Onde estava? Ah, sim. A vida. Lembro de vê-lo chegando ao meu lado e colocando uma xícara de chá sobre a mesa. Puxou uma cadeira, petulante, para sentar-se ao meu lado. Começou a ler o que eu antes escrevia.

- Pensas que vai morrer? – pergunta-me. Eu encaro seus olhos verdes por algum tempo, sem saber como dar uma resposta.

- Todos nós vamos mo...

- Tente dar uma resposta mais original – faz uma pausa – Pensas que vai morrer?

Tirei um tempo para pensar, encarando-o, sentindo sua mão segurar a minha e apertá-la, como que para me encorajar a dizer o que eu pensava.

- Não, eu não diria isso – expliquei – É que às vezes apenas não acho motivo para viver.

Ele apertou ainda mais minha mão. Surpreendentemente, você consegue me fazer sentir coisas que nem eu sabia que existiam. Do jeito que elenunca conseguiu. Talvez seja por isso que ele tenha partido. Sim, agora que penso, talvez seja isso mesmo.

Eu não havia tentado nada com você até o momento. Era apenas um garoto, o que poderia entender de mim?

Escrevo desde que me entendo por gente. Quero dizer, desde que era apenas um garoto, sempre escrevi. E meus momentos mais negros foram quando estava apaixonado. Geralmente não me apaixono. Como sempre disse, minha grande paixão sempre foi a escrita. Mas, nos poucos momentos da minha vida em que senti desejo por alguém, meus textos sempre ficavam piores, mais sombrios, sem sentido. Você intensificou isso, sabe?

Eu te queria, te desejava. Tratava de expor tudo o que sentia através de minha escrita e me surpreendia com as constantes cenas de sexo que insistia em colocar no texto. Você se sentava ao meu lado, trazendo-me uma xícara de chá e lia o que eu escrevia, sempre com seu típico bom humor.

- Eles transam como coelhos, não? – e riu.

Lembro bem de minhas personagens. Tinha o rapaz, um tipo de galã de filmes antigos, e a mocinha, Mia, tão bela quanto inocente. Bem, não mais.Ele a havia sujado de todas as maneiras possíveis. Queria manchar a inocência.

E como não podia realizar meus desejos na vida real, afogava-os todos na ficção. Assumo que já havia feito isso outras vezes, mas essa fora a que eu mais me entregara.

Mia era uma personagem bela, de olhos azuis, e, por mais que nunca tenha tido muito interesse em mulheres, era meu tipo. Era meu tipo porque era igual a você. Os cabelos, os traços, até a maneira inocente de falar. E eu queria tanto te sujar.

E te sujei, não é? Olhar para túmulos sempre me deixa melancólico. Costumava evitar cemitérios, antes daquilo.

Lembro do meu galã. Lembro de como ele se corrompeu, de como a cada dia foi ficando mais e mais louco de amores por Mia. Mia era a perfeição. Simplesmente minha melhor personagem. Ela era viva. Saía dos papéis, algumas noites, enquanto estava deitado em minha cama e seduzia-me. E eu a agarrava sem escrúpulos e jogava-a na cama, possuindo-a. Seus gemidos de prazer podiam ser ouvidos de longe. Era minha. Minha melhor criação, a única coisa perfeita que eu conseguira criar com meus dedos.

Ela vinha de vez em quando e colocava uma xícara de chá ao meu lado enquanto eu escrevia, puxava uma cadeira e punha-se a ler. Então eu me virava e encarava seus olhos azuis e seu lindo sorriso e ignorava todas aquelas noites quentes no meu quarto. Sabia que ela lembrava-se, trocávamos olhares cúmplices com freqüência.

Mas naquele dia foi diferente. Terminei de escrever a história sobre Mia e, quando ela sentou-se do meu lado, entregando-me uma xícara de chá e lendo a última palavra da folha (e também da história), um grande FIM, em letras maiúsculas, perguntou-me:

- Cansou de escrever sobre ela?

Ela? E por um segundo te enxerguei novamente. Tu não eras ela. Eras, se me permite dizer, infinitamente mais bonito. Tu eras vivo.

- Como pude...? – pensei alto. Tu permanecias a me encarar, parecendo levemente confuso – Como pude fazer isso com você?

Passei uma de minhas mãos enrugadas no seu rosto e confundi-te novamente com ela. Ela estava a sorrir para mim, provocante, como sempre fazia quando queria que eu tomasse sua boca e a invadisse, violando-a das piores maneiras imagináveis.

- Está tudo bem? – tu perguntas. Fecho os olhos, tentando mandá-la para longe.

Impossível.

Agarro-te, segurando seus braços enquanto ataco sua boca com um beijo. Tu tentas desvencilhar-te, mas eu o seguro ainda mais forte, já abrindo suas calças.

- Mia, minha Mia – sussurro, beijando-lhe o pescoço.

E você vai se afastando cada vez mais.

Me perdoe, me perdoe. Cada vez que penso em como estava errado, em quanto sofrimento lhe causei, me sinto pior.

- Você está louco! – exclama, finalmente se afastando de mim e correndo para o outro lado da sala, onde eu guardava minhas bebidas.

- Mia, por que foges de mim? – agarro-te novamente, mas antes que pudesse fazer qualquer coisa contra você, sinto algo em minha nuca. Uma dor horrível que, então, se torna confortável, um tanto quente. Úmida.

E eu caio.

As lágrimas nos seus olhos enquanto você diz repetidamente “perdão, perdão”. Coloca as mãos no meu pescoço e depois encara as próprias mãos manchadas de vermelho, chorando como nunca. Encaro-te pela última vez e lembro-me de como sempre me entregava uma xícara de chá quando eu estava escrevendo. Não podia ter te confundido com ela, nunca. Tu és inocente e, agora via em seus olhos, como nunca havia visto antes em ninguém, que me amavas. E nem precisavas de palavras para expressar aquilo. E seu amor era inocente, como o dela nunca haveria de ser, como o meu nunca havia sido.

- Eu não deveria ter te confundido com ela – disse, finalmente – Eu sabia como ia acabar.

Lembro de ter fechado os olhos, fraco, mas ainda vivo. Ouço você se aproximando da máquina de escrever e arrancando a última folha enquanto lia. Meu galã, dominado de desejo, tenta tomá-la à força e, como nunca a criei para ser inocente, ela o mata. Era um final bom, não? Dramático na medida certa. Analisei todos os ângulos possíveis vendo se era clichê ou não e cheguei à conclusão que não. Mas ali estava eu, deitado, morto. E eu sempre tentei, em minhas histórias, fazer um retrato da vida, e finalmente havia conseguido.

Odeio olhar túmulos... Sempre me deixam melancólicos. Principalmente quando é o meu próprio. Você aparece aqui algumas vezes e coloca uma flor sobre o mesmo e lamenta por alguns segundos antes de ir embora. E eu me sinto feliz por poder te ver. Não ligo muito para as outras pessoas que vem me visitar, mas você... Você é outra história.

E então tu apareces aqui hoje, enquanto estou sentado sobre minha lápide, e olha para meu nome escrito na mesma, respira fundo, e deixa sobre a terra um livro. E eu sabia exatamente que livro era. Sorrio para você por um momento, mesmo que não possa me ver, e, enquanto você se vira para ir embora, ando ao seu lado. Tu sentes uma brisa fria à tua direita e se cobre melhor com seu casaco. Eu rio. Você lida com a morte à sua maneira, tão complicada, vindo me trazer flores semanalmente, achando que, de onde quer que eu estivesse, eu estaria me importando. E ali estava eu, rindo de teu comportamento.

Sabe? Lidar com a morte é bem mais fácil quando se está morto. E quando se tem boa companhia.

Ouço uma risada do meu lado e me viro, sorrindo, para encarar seus olhos azuis.

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Nesse mês tivemos uma história original no topo do nosso pódio, escrita pela nossa querida cahnove, que nos proporcionou a entrevista desse bimestre.

Need For Fic: Qual foi a sua inspiração para essa fic?
Eu sempre gostei de histórias de fantasmas. Eu escrevia quando era menor (quanto tinha 7 ou 8 anos), mas foi apenas agora que decidi escrever uma mais "séria". Na última vez que eu escrevi para o Concurso, com a fic A Acrobata, eu tinha acabado de ler Coisas Frágeis que é um livro de contos do Neil Gaiman. Esse livro sempre me dá inspiração. Quando escrevi Mia, eu tinha acabado de ler Coisas Frágeis 2, e surgiu o mesmo surto de inspiração. Escrevi essa história em, mais ou menos, uns 50 minutos, num dia que tinha acordado cedo demais, e, admito, ficou bastante diferente das coisas que eu geralmente escrevo e eu fiquei pensando o tempo todo que ninguém iria gostar, porque, sinceramente, era uma história estranha até para mim. Também assisti um filme chamado Deuses e Monstros, com o Ian McKellen, que interpreta um velho diretor de cinema homossexual. Acho que nunca teria a ideia se não fosse esse filme.

Need For Fic: O personagem dessa fic é um escritor, como a gente. Você se sente relacionada a ele de alguma forma, nessa confusão entre o que é real e ilusório?
Eu AMO escrever sobre escritores. Geralmente meus escritores são mais boêmios do que devem ser, mas me agrado com eles. Mas não, não me relaciono com a personagem. Procuro me afastar o máximo possível de meus personagens para não me apegar a eles. É difícil, por exemplo, matar alguma personagem que você criou carinho. Mas admito que, nos costumes de escrita, somos quase iguais. A maneira com que o escritor não gostava de ser interrompido, ou, como disse no texto, "preciso que minhas personagens sejam humanas, que saiam das páginas e venham sussurrar-lhe ao ouvido as palavras que eu coloquei em suas bocas." Mas não gosto que as pessoas fiquem do meu lado quando estou escrevendo...

Need For Fic: Qual fandom você nunca escreveu mas tem vontade de escrever?
Acho que essa é a pergunta mais difícil de todas. Eu procuro escrever sobre TUDO que tenho vontade. Eu não posso assistir um filme que já fico com vontade de escrever sobre ele, nem que seja um parágrafo... Mas nem sempre posto. Mas, bem, me agrado com fandoms desconhecidos, e assisti um filme canadense chamado "Eu Matei Minha Mãe" e estou louca para escrever sobre ele.

Need For Fic: Fale um pouco sobre a sua trajetória antes e depois do NFF.
Eu costumava escrever para o animespirit.net (embora nunca tenha gostado muito de lá). Daí passei para o Nyah! Eu tinha minha conta normal por lá, que já não uso mais, e um pseudônimo, que uso até hoje. Infelizmente, gosto de poucos autores/leitores no Nyah! também. Aqui eu encontro ótimos escritores e, também, ótimos leitores. Tenho de admitir que cresci muito aqui. Tenho de agradecer MUITO a Hannah por ter me convidado para participar da Gincana de dois anos atrás, e a Ladie e ao Wateru, que entraram comigo e são dois dos melhores escritores que eu conheço.

Por fim, que mensagem gostaria de deixar para as pessoas do fórum?
Certo, ESSA é a pergunta mais difícil. Eu não sei o que dizer, estou no fórum há um ano e meio e ainda me sinto tão nova por aqui. Apenas quero dizer que esse é o melhor fórum de fanfics e histórias que já participei, com os melhores e mais comentaristas leitores e alguns dos melhores escritores do mundo. Me sinto orgulhosa de fazer parte.